O Retrato de um Dorian Gray Jurídico em Portugal, por Pedro C. Rocha

O Retrato de um Dorian Gray Jurídico em Portugal, por Pedro C. Rocha

O livro de Oscar Wilde trata sobre a vida de um homem que, de forma indireta, acaba fazendo um pacto para permanecer com a aparência jovem para sempre.

Apesar dessa vantagem, uma pintura do protagonista feita por um de seus amigos acaba manifestando em sua aparência todas as imperfeições da alma de Dorian Gray, e assim o e ou pretende ser este artigo de opinião sob o sistema jurídico português.

O sistema judicial português tem atraído e sido alvo de inúmeras críticas e mesmo consideráveis nos últimos anos. Atingindo inclusive, o demérito de ser objecto de estudo e análise por parte de entidades internacionais.

Em 2024, Transparency International, que é organização internacional cujo objevtivo é combater a injustica da corrupção, concluiu que o sistema judicial português se encontrava “afunilado” ou “congestionado”, salientando, como resultado palpável, a título de exemplo os inquéritos atinentes à economia, finanças e corrupção haviam levado a poucas acusações, muito menos sentenças de prisão.

Como ponto fulcral, a ausência de uma verdadeira independência entre Governo e os Tribunais, naturalmente afecta a separação de poderes e a independência dos Tribunais não contribui para o isento funcionamento do sistema judicial português, esta é uma conclusão das instâncias comunitárias euroreporter).

Em 2015, Portugal foi alvo e sujeito de análise e de estudo, por uma Relatora Especial da ONU, Dra Gabriela Knaul, Advogada, de nacionalidade Brasileira, as conclusões do seu relatório apontavam para o facto do sistema judicial português ser essencialmente “lento, caro e difícil de compreender”.

A UE primeiro em 2017, apontou que Portugal se encontrava entre os países da União com maior número de processos cíveis e comerciais pendentes, com períodos de espera compreendidos e apurados de 900 a 1100 dias para os cidadãos, até que fosse seja obtida uma tão almejada sentença, dados obtidos segundo a Justice in the Union Scoreboard).

Em 2020 o Conselho da Europa (European Judicial Systems CEPEJ Evaluation Report) denunciou as taxas de Justiça praticadas em Portugal (isto é, os montantes pagos para dar início a um processo judicial), ou seja um triste retrato da Justiça em Portugal em que a Justiça é lenta e só é acessível a quem pode pagar excessivas custas judicias ou a quem beneficia de apoio judiciário.

Com profunda tristeza constata-se que, Justiça portuguesa se encontre descredibilizada. Em finais de 2022, foi efectuado um inquérito, que revelou, que a Justiça é a instituição em que os portugueses menos confiam.

Pelo que, é imprescindível devolver a confiança aos cidadãos e á sociedade na Justiça.

Mas, o sistema judicial português padece de muitos males, mas sem sombra de dúvidas que os caminhos a trilhar, passarão por uma efectiva redução das custas judiciais que impedem o acesso de uma relevante granja de cidadãos à Justiça, garantir uma verdadeira autonomia, isenção, imparcialidade e independência dos Tribunais e do Ministério Público, uma Dignificação do papel e relevância do Advogado , e a fixação de uma remuneração condigna aos Advogados que prestam serviço e concretização do desiderato constitucional inscritos no Apoio Judiciário- todas estas, são exigências todas como básicas em qualquer Estado de Direito Democrático.

Deverá ainda ser adicionado a estas metas, o aumento da moldura penal para o crime de violação do segredo de justiça.

Pois o dano que cria e gera e viola, o princípio da presunção de inocência e à dignidade do suspeito é verificado mesmo na hipótese de o suspeito ser condenado posteriormente, devido ao abuso dos meios de comunicação que causa uma condenação antecipada, ou seja, a condenação midiática, ou mesmo que absolvido em Tribunal, já o foi no circo mediático dos media.

Diante de reiterada divulgação sensacionalista, com potencialidade para comprometer um justo julgamento, deve-se, sim, buscar minimizar os danos daí advindos.

Existe um instigante livro, cujo título é Giustizia Mediatica, por Vittorio Manes, catedrático de Direito Penal de Bolonha, que revela os comprometimentos do ato de julgar, agora sujeito aos impactos da espetacularização. O acusado, que deveria presumir-se inocente, é tido como culpado antes do julgamento.

Como alerta Manes, a condenação midiática opera de imediato seus efeitos, prescindindo da prova e do contraditório no tribunal público das redes sociais ou da imprensa sensacionalista.

Por isso, postula que o conceito de publicidade e os seus limites sejam adequados aos valores do Direito, de um lado, a liberdade de expressão e, de outro, a reputação individual e a garantia de julgamento justo.

Para que o indiciado não seja “sacrificado no altar midiático”, deve-se permitir apenas a divulgação, relativa a fato em julgamento, do estritamente necessário para fins informativos, sem afrontar a presunção de inocência.

O relevante é viabilizar a mais célere neutralização das informações de culpabilidade antecipada e restaurar a repristinação da dignidade pessoal, quando sobressaia eventual absolvição.

A Convenção Europeia de Direitos Humanos estatui como garantia, no art. 6.º, o direito a julgamento imparcial. No confronto entre tal garantia e a liberdade de expressão, esta deve ser restrita, segundo o art. 10.º, inciso 2, para “assegurar a autoridade e a imparcialidade do poder judicial”.

No Direito inglês se prevê como infração, passível de pena de prisão, a prática de qualquer ato que tenda a constranger juiz ou tribunal, para garantia de processo imparcial e para que os jurados não cheguem ao julgamento com ideias preconcebidas.

Creio não caber criminalizar a manifestação de pensamento, por mais veemente que sejam, nos meios de imprensa tradicionais ou na internet, as notícias sobre o crime em julgamento.

Contudo, deve-se, sim, diante da existência de reiterada divulgação sensacionalista, com potencialidade para comprometer um julgamento justo, buscar minimizar os danos daí advindos.

Em complemento, deve haver dispositivo legal que garanta ao prejudicado, em vista de reiteradas notícias de sua culpabilidade, o direito de resposta.

Este se destinaria unicamente a alertar os destinatários da notícia sobre a existência de campanha que compromete a realização de juízo imparcial, sem entrar na discussão das provas acerca da inocência, ou não, do suspeito ou acusado.

O direito de resposta deve deixar consignada a existência de um julgamento midiático antecipado, concitando a que o juízo afaste a presunção de culpabilidade, para que, livre de preconceitos, se elabore a decisão.

Pois como Aristóteles o disse “A base de uma sociedade é a Justiça”

E que justiça queremos para nós enquanto Sociedade Portuguesa?

Dr. Pedro Carrilho Rocha – Advogado

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