Desvendando Desigualdades, por Pedro C. Rocha
A Absurda Disparidade de Gênero na Sociedade
Dispõe o artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, que: “(…) 1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.(…)”
Contudo, será mesmo assim como tal decorre da lei fundamental, que ninguém pode ser prejudicado em função do sexo?
Pesarosamente, a resposta terá que ser negativa. Para a sociedade portuguesa quinquagenária, desde o vinte cinco de abril , ainda falta um longo caminho a percorrer, no que concerne aos direitos da mulher enquanto verdadeiro cidadão, nas mais variadas vertentes, sejam elas profissionais, laborais e mesmo civis.
Recordemos Regina Quintanilha a primeira mulher licenciada em Direito, pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, contudo, para tal ainda foi necessário que o Conselho Universitário tivesse reunido para deliberar sobre a sua possibilidade de ingresso, face ao facto de ser uma aluna do sexo feminino, deliberação essa aprovada.
Posteriormente, assim surgiu a primeira Advogada em Portugal, a 14 de Novembro de 1913, a Dr.ª Regina Quintanilha fez a sua estreia enquanto Advogada no Tribunal da Boa Hora, curiosamente somente após, o Supremo Tribunal de Justiça lhe ter dado autorização para advogar.
A luta estoica e heroica desta notável mulher, deverá ser objecto de reflexão e de reverência, desde o combate por esta encetado para poder frequentar uma Universidade no curso de Direito, até à luta no Supremo Tribunal de Justiça para obtenção de autorização para advogar.
Mulher notável, que além do exercício profissional, publicou diversos trabalhos jurídicos e desempenhou as mais diversas funções, nomeadamente, procuradora judicial, conservadora do Registo Predial e por último de Notária.
Para lá da sua morte, a sua memória permanece como um singular exemplo das qualidades no exercício da profissão.
A presença e o papel das mulheres no mercado de trabalho em Portugal passaram por significativas transformações ao longo das últimas décadas. Historicamente, as mulheres enfrentaram desafios relacionados à igualdade de oportunidades e à conciliação entre a vida profissional e pessoal. No entanto, mudanças sociais e legislativas têm contribuído para alterar esse cenário.
Nas últimas duas décadas, observou-se um aumento notável da participação das mulheres no mercado de trabalho português. Isso se deve, em parte, a um maior ênfase na educação feminina e ao acesso crescente das mulheres a cursos superiores e profissionalizantes. Esse avanço educacional resultou em uma presença mais expressiva em setores que antes eram predominantemente masculinos, como ciência, tecnologia, engenharia e na justiça
Muito evoluiu a sociedade portuguesa desde então, atualmente as mulheres representam 61% dos juízes nos tribunais em Portugal, mas ainda estão em número reduzido no Supremo Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Administrativo, contudo constata-se, porém, uma cada vez maior preponderância de juízas nas primeiras e segundas instâncias.
Este aumento das mulheres nos tribunais é uma notória evolução e diga-se devida, se for tido em conta que até 1974 o acesso à carreira estava vedado às mulheres.
A implementação de políticas de igualdade de gênero e a conscientização sobre a importância da diversidade no ambiente de trabalho também desempenharam um papel crucial.
Leis que promovem a igualdade salarial e combatem a discriminação de gênero têm contribuído para criar um ambiente mais equitativo para as mulheres no mercado de trabalho.
Entretanto, desafios persistem. A disparidade salarial entre homens e mulheres ainda é uma realidade em alguns setores, e o acesso a cargos de liderança muitas vezes é mais difícil para as mulheres.
Além disso, a conciliação entre as responsabilidades profissionais e familiares continua a ser um desafio para muitas mulheres, apesar dos avanços em termos de licença-maternidade e flexibilidade no trabalho.
Outro ponto importante é a representação das mulheres em cargos de alta liderança e em conselhos de administração. Apesar de alguns avanços, a presença feminina nessas posições ainda é inferior à dos homens, evidenciando a necessidade contínua de promover a igualdade de oportunidades em todos os níveis hierárquicos.
É fundamental reconhecer que as diferenças na experiência profissional das mulheres em Portugal não são homogêneas. Mulheres de diferentes origens étnicas, classes sociais e idades podem enfrentar desafios únicos.
Portanto, abordar as questões de gênero no trabalho requer uma abordagem inclusiva que leve em consideração as diversas realidades das mulheres portuguesas.
Em resumo, embora tenham ocorrido avanços significativos nas últimas décadas, as mulheres em Portugal ainda enfrentam desafios no mercado de trabalho.
A promoção contínua da igualdade de oportunidades, a eliminação das disparidades salariais e o estabelecimento de políticas que facilitem a conciliação entre trabalho e vida pessoal são passos cruciais para alcançar uma sociedade mais justa e igualitária.
Pelo natural decurso do tempo, a sociedade portuguesa, criou a lei da paridade entre homens e mulheres, importante medida legislativa que busca garantir a representação equitativa de ambos os sexos em diversas esferas da sociedade, incluindo, mas não se limitando, à política e ao ambiente de trabalho.
Embora nobre esta conceção, e novação legislativa em Portugal. A ideia por trás desta lei é não apenas corrigir desequilíbrios históricos, como também promover uma igualdade de oportunidades e garantir que as decisões importantes reflitam em si próprias uma diversidade de perspetivas quanto ao gênero.
No entanto, a eficácia dessas medidas pode variar, e há debates sobre a melhor abordagem para promover a igualdade de gênero sem comprometer os princípios da meritocracia.
A lei para paridade, e a necessidade da sua existência, deverá antes do demais ser considerado um verdadeiro insulto para as mulheres, uma verdadeira ignominia, devido em primeiro lugar á sua existência e num segundo lugar pela estatuição de uma obrigatoriedade ou dever de uma inclusão em vez de uma meritocracia.
Tal de todo não deveria suceder, as mulheres e homens devem ter acesso às mesmas condições independentemente de que qual o foro seja, seja ele, profissional, político, financeiro, laboral e cívico, com plena igualdade de direitos e deveres, sem toda e qualquer descriminação.
A sociedade portuguesa, lentamente vai-se afastando do seu estereótipo de matriz patriarcal, para uma sociedade mais pluralista, contudo, a mesma já é quinquagenária, não obstante a sua distinta idade, é imperioso que as diacronias se esbatam ou caiam quais muros de Berlim, caminhando assim para uma Sociedade pluralista e justa.
Ao fim ao cabo, existirão ainda dúvidas quanto à mulher ser efetivamente o sexo mais forte?, e as diversas velocidades da evolução da sociedade não acompanham as muy devidas e imperiosas necessidades de mudança? Que sociedade portuguesa efetivamente queremos e o que poderemos enquanto indivíduos e cidadãos contribuir para que as mudanças aconteçam?
Dr. Pedro Carrilho Rocha – Advogado