Um Big Brother ou uma Sociedade mais Segura?
Este artigo propõe-se a explorar o universo de argumentos a favor e contra a adoção de um sistema de vigilância em larga escala a título de exemplo na cidade de Lisboa, atendendo e considerando as implicações para a privacidade, a segurança e a qualidade de vida dos cidadãos.
No entanto, como em tantas outras s cidades modernas, surge a questão crucial sobre a implementação de um sistema de vigilância abrangente para garantir a segurança pública, e a eterna guerra da proteção de uma sociedade versus a violação dos direitos de privacidade.
A implementação de um sistema de vigilância pode ser vista como uma medida eficaz para combater o crime e garantir a segurança dos cidadãos.
Câmeras de vigilância podem ser estrategicamente colocadas em áreas de alto índice de criminalidade, proporcionando uma presença virtual que dissuade ações criminosas. Um sistema de vigilância bem projetado pode permitir uma resposta rápida a incidentes, como furtos, roubos, agressões e outros episódios de violência.
A capacidade de uma monitorização de áreas em tempo real, poderia facilitar a intervenção imediata das autoridades, reduzindo potencialmente o tempo de resposta em situações de emergência, bem como a sua utilização para uma mais cabal identificação dos autores, quer imediata quer mediata dos actos praticados, direções e destinos.
As gravações das câmeras podem servir como evidências valiosas na investigação e resolução de crimes de diversas naturezas, pelo que a presença de um sistema de vigilância poderia aumentar a probabilidade na captura de criminosos.
Porém, um dos principais e recorrentes argumentos contra o sistema de vigilância é a preocupação com a invasão de privacidade dos cidadãos.
A mera existência de Câmeras em locais públicos, as quais poderão inadvertidamente capturar atividades privadas, levantando questões éticas sobre o direito à privacidade do individuo.
A existência de um sistema de vigilância abrangente poderia permitir a supervisão indevida das atividades cotidianas dos cidadãos, acarretando em possíveis violações éticas e injustiças. Um acesso irrestrito por parte destas às imagens gravadas pode resultar em práticas questionáveis, comprometendo assim a integridade e fins do sistema.
A presença visível de câmeras de vigilância pode criar uma atmosfera de vigilância constante, potencialmente desencorajando uma das principais fontes de receita do pais, o turismo.
Os turistas podem sentir que sua liberdade e privacidade estão comprometidas, afetando negativamente a reputação dessa mesma cidade, contudo este argumento apresenta-se como falacioso, pois inúmeras cidades da Europa, Londres a título de exemplo, detém um amplo sistema de videovigilância instalado na cidade, não sendo por isso que os números de respeitantes ao turismo se repercutem ou apresentam como baixos..
Por último, o erário público, a instalação e manutenção de um sistema de vigilância abrangente exigiria a alocação de recursos financeiros e humanos significativos.
A decisão de implementar ou não um sistema de vigilância em Lisboa é complexa e multifacetada.
É crucial considerar os benefícios em termos de segurança pública em contraste com as preocupações legítimas sobre a privacidade e o uso ético dos dados.
O direito à privacidade é um princípio fundamental que reconhece a autonomia e a liberdade individual no que diz respeito à sua vida pessoal e informações pessoais, sendo essencial para proteger a dignidade humana e preservar a intimidade das pessoas.
O direito à privacidade abarca diversas áreas, incluindo a proteção de dados pessoais, a inviolabilidade do lar, a comunicação privada e a liberdade de pensamento
Não obstante a legislação de proteção à privacidade varia de país para país, mas muitas nações reconhecem o direito à privacidade como um direito fundamental. Em alguns casos, organismos internacionais estabelecem padrões e diretrizes para garantir a proteção da privacidade em âmbito global.
É importante ressalvar que o avanço tecnológico, especialmente nesta era digital, trouxe desafios adicionais à proteção da privacidade. Questões como vigilância em massa, coleta excessiva de dados pessoais e a falta de controle sobre informações pessoais destacam a necessidade contínua de desenvolver e fortalecer leis e regulamentações que garantam a salvaguarda do direito à privacidade.
O direito à privacidade é crucial para preservar a autonomia, a dignidade e a liberdade individual, sendo essencial no mundo contemporâneo, onde as tecnologias digitais desempenham um papel significativo em nossas vidas cotidianas.
Porém, a implementação de um sistema de vigilância em larga escala, acarreta em si mesmo ainda outras questões que chocam com o direito à privacidade dos indivíduos ou cidadãos, como a efetiva delimitação do que constitui os espaços como, espaços públicos e privados, apresenta-se assim como crucial nesse debate.
Pese embora, seja amplamente aceite que locais públicos estão ou poderão estar sujeitos a observação, a extensão dessa vigilância levanta preocupações sobre até que ponto a privacidade dos indivíduos pode ser comprometida.
Por outro lado, já não de natureza espacial ou territorial, mas sim, de natureza ou índole pessoal e assim intrinsecamente individual, importa trazer assim á colocação, que a eventual implementação de um sistema de videovigilância, com o recurso à utilização de tecnologia avançada, a qual já existe e se encontra à disposição, como o reconhecimento facial, poderia colidir face ás preocupações individuais.
Pelo que, o rastreamento constante e a identificação biométrica podem resultar em uma vigilância praticamente onipresente, colocando em xeque a liberdade individual e a capacidade de anonimato do vulgo cidadão.
Como em todas as variantes, é necessário, independentemente, de uma implementação ou não de um sistema de videovigilância, a existência de mecanismos de controle e de fiscalização, como forma de mitigar as preocupações sobre violações de privacidade.
Por conseguinte, é fundamental que um sistema de vigilância seja transparente e sujeito a medidas robustas de “accountability”, em que os cidadãos devem ser informados sobre o propósito da vigilância, bem como quanto às políticas de retenção de dados e os protocolos de acesso.
A decisão de implementação de um sistema de vigilância não deve ser tomada levianamente. É essencial ponderar os benefícios em termos de segurança pública com a imperiosa salvaguarda do direito à privacidade dos cidadãos.
É a busca incessante por um equilíbrio adequado entre a segurança e os direitos individuais de cada um dos cidadãos, pois apresenta-se como uma responsabilidade coletiva.
Somente através de uma abordagem ética e ponderada, uma cidade ou mesmo uma sociedade, pode enfrentar os desafios contemporâneos da segurança urbana sem comprometer os valores fundamentais.
Que sociedade queremos e que valores estaremos dispostos a sacrificar em nome de uma segurança?
Dr. Pedro Carrilho Rocha – Advogado