A Dignidade, por J. Vitorino
A dignidade é o vértice de todos os sentimentos humanos; e quando esta se perde, todos os outros se desmoronam.
Os portugueses vão ser brevemente chamados a votar no dia 10 de março; devolver-lhes a dignidade, é uma das frases mais utilizada pelos candidatos da esquerda à direita.
Em eleições autárquicas ou legislativas, (os mágicos da palavra), dizem todos querer que os portugueses recuperem a dignidade, portanto partiram do pressuposto, de que infelizmente muita gente a perdeu.
Não podia estar mais de acordo com a intenção, mas a dignidade não é uma semântica filosófica; é um sentimento humano que não se perde por se ser pobre, mas a pobreza de longa duração, cujos artífices são as elites políticas que governam Portugal há 49 anos, são os únicos responsáveis pela situação de pobreza, em que quase 50 por cento dos portugueses se encontram, se estabelecermos um paralelo com os nossos parceiros europeus; é este o caminho sem contorno possível, que leva muitos dos nossos melhores cidadãos à perda da dignidade.
Um casal de reformados com um rendimento conjunto de 730 euros, têm a filha e genro desempregados de longa duração, já sem direitos a subsídios apesar de terem duas crianças; os avós com as suas miseráveis reformas, são o único suporte das 6 pessoas desta humilde família, pelo que vivem cheios de privações.
Esta situação revoltante, poderia ser compreensível se não fosse tida em conta a situação que se passa em Portugal, com milhares de milhões a serem injetados em empresas como a TAP por exemplo, em que o colapso é uma questão de tempo.
Com alguma revolta contida, disse-lhes que pedissem ajuda a amigos ou instituições porque não é vergonha pedir trabalho e comida, se não conseguimos o primeiro; disseram-me que pedir esmola é perder um pouco a dignidade, e que apesar de todas as dificuldades a querem manter.
Mas eu disse-lhes que não fazia essa leitura, numa situação de emergência como a que está em causa; que é o alimento mínimo para as crianças sobreviverem e se manterem saudáveis; até porque serão elas que no futuro, terão que pagar a dívida pública que enriqueceu 10% da população deste país; que em parte foram os responsáveis pela pobreza endémica, que atingiu a esmagadora maioria da população portuguesa.
Esta conversa com o casal de reformados deixa-nos um sentimento de revolta, porque este caso em concreto é a ponta do iceberg do que se está a passar neste pobre país.
Disse-lhes que não perdessem a esperança, porque Portugal tem que mudar; e se não existir coragem política para inverter o ciclo de pobreza em que os portugueses caíram, a pressão será exercida do exterior, para que se acabe com tanta desigualdade e injustiça num país, que abusa do termo e palavra “democracia”.
Nesse mesmo dia, um dos indiciados numa das maiores fraudes bancárias na Europa dos últimos anos, e que por coincidência é português, foi encontrado a passar férias nas Ilhas baleares; todos nós infelizmente, sabemos bem o seu nome.
O país está pobre e carece de quase tudo, e as instituições de caridade crescem a um ritmo alarmante; mas do que não precisa, é de alguém que queira tapar os olhos aos portugueses, para o que se está a passar no Portugal real; onde é visível a falta de sensibilidade pelo sofrimento de um povo, que há décadas vem sendo sistematicamente espezinhado por aqueles, que se dizem seus defensores; onde no interior do país os municípios mais pobres, lutam desesperadamente para acudir às suas populações.
Quanto á dignidade, ninguém a consegue manter submersa na pobreza; porque ela é a portadora de muitos dos males, que fogem ao controle de quem é apanhado neste terrível paradigma; que é escolher entre a sobrevivência, ou manter a dignidade em pobreza extrema.
O Cadaval é um dos Concelhos mais pobre da zona Oeste, não obstante estar situado a 70 quilómetros da Capital do país, e estar bem servido de autoestradas A-8 a Ocidente e A-1 a Oriente, e ainda a linha férrea que passa a 3 quilómetros no vizinho Concelho do Bombarral.
A falta de investimento no Concelho, reflete-se na baixa taxa de empregabilidade; pelo que a pera rocha e o vinho são a única subsistência das populações locais; tendo a gestão autarca tudo feito para minimizar os efeitos de uma crise, que teve início em 2008 e se agravou com a pandemia Covid-19; o que veio a atingir negativamente alguns projetos em curso.
Nos próximos discursos de vitória nas legislativas, todos vão prometer aos portugueses a dignidade que lhes é devida; esquecendo que foram os partidos que representam, os principais responsáveis pela enorme fábrica de pobreza, em que Portugal se transformou nos últimos anos, o que levou dezenas de milhares de portugueses à compulsiva perda de dignidade.
J. Vitorino – Jornalista- Diretor do Vila de Rei
