Vera Silva Santos vem ajudar a equipa a partir da Sertã

Fortalecendo a nossa presença na região,contamos agora com a Escritora e Psicóloga Vera Silva Santos.

Bem vinda

BIOGRAFIA PESSOAL DE VERA SILVA SANTOS 

Vera Silva Santos

Vera Silva Santos

Vera Silva Santos nasceu às onze horas do dia três de janeiro de mil novecentos e oitenta e três na Maternidade Bissaya Barreto em Coimbra.

É fruto de um casamento que durou sete anos e o seu nascimento foi pautado por uma gravidez de risco, tendo o parto sido de cesariana às trinta e duas semanas de gestação.

Nasceu com um quilograma e cento e setenta e cinco gramas e esteve um mês numa incubadora para que o seu desenvolvimento terminasse e as suas funções vitais estabilizassem.

É quarta filha do casal, contudo, a única sobrevivente.

Os seus pais divorciaram-se quando tinha apenas dezassete meses de idade e o contato com o pai foi muito reduzido até aos seus quatro anos de idade.

Após essa data deixou de ter qualquer contato com ele.

Mais tarde, já adulta, contatou com o pai meia dúzia de vezes e no leito de uma cama de hospital ouviu-o dizer-lhe que tinha orgulho nela, apesar de todas as circunstâncias negativas que um divórcio litigioso deixou pelo longo tempo em que decorreu, chegando a contar mais de dezasseis anos seguidos em processos judiciais devido a partilhas de bens.

Da sua infância, vivida na Amieira, freguesia do Alqueidão (terra do arroz carolino), concelho de Figueira da Foz, recorda a altura em que frequentou o primeiro ciclo do ensino básico, as idas a pé para casa depois das aulas com as brincadeiras comuns com os colegas, o tempo que passava na horta com a avó materna, as brincadeiras com as primas por entre os milharais dos vizinhos e o cheiro da vindima onde o seu padrinho, ano após ano, colocava o velhinho rádio trazido do Luxemburgo pelo seu avô materno no canal que mais gostava.

Recorda ainda as matanças do porco, altura de convívio entre muitos elementos da família, assim como os dias de colher mato onde se levava o almoço e se fazia um piquenique no meio do pinhal.

Desde muito nova mostrou uma personalidade particular que a foi levando a afastar-se e a isolar-se da família em vários momentos da sua vida.

Não o fez por mal, fê-lo porque não se sentia completa ou apenas porque percebia que não se conseguia enquadrar com facilidade. Nunca foi uma excelente aluna.

Pelo contrário, sempre teve de estudar muito, passar horas agarrada aos livros e muitas vezes algumas disciplinas eram feitas com a nota mínima para poder passar.

Os anos decorreram. Estudava e nos tempos livres estava com a avó materna que sempre a acompanhou desde que nasceu.

Uma mulher forte, de personalidade vincada e de um feitio peculiar.

Uma mulher que tinha ficado viúva um ano antes de a Vera nascer e que já tinha passado muito na vida para criar o seu casal de filhos, como costumava dizer.

Durante dezoito anos viveu com a sua mãe num quarto ao lado de um café que os pais tinham construído em mil novecentos e oitenta.

Foi este café que motivou que o processo de partilha de bens decorresse tantos anos em Tribunal.

Aos fins-desemana e nas férias ajudava a mãe no café.

Mas não gostava de o fazer.

Não gostava da exposição pública.

Era demasiado tímida ou então simplesmente não se conseguia sentir bem naquele meio.

Contudo, hoje ainda sente saudades de alguns clientes, aqueles que lá iam todos os dias e que já faziam praticamente parte da família.

Ainda hoje recorda o cheiro dos petiscos que faziam à terça e à sexta-feira.

Ainda hoje se vê atrás do balcão como uma menina pequena.

Quando tinha dez anos a mãe teve um acidente vascular cerebral.

Esteve oito dias internada e um mês em casa sem poder trabalhar.

Este foi certamente o seu primeiro momento de dor maior.

Era o mês de iniciar a escola no segundo ciclo. Ia para uma escola maior, para uma outra localidade. Teria de ir de autocarro e não sabia bem o que fazer.

Teve a sorte de ter duas pessoas que a ajudaram bastante.

Uma delas foi uma prima que era professora do primeiro ciclo e que a ajudou falando com os professores e explicando-lhe o que a Vera estava a passar naquele momento.

E a outra pessoa foi um ex-namorado da sua mãe que durante alguns anos foi uma figura de referência para a Vera. Não era o tipo de homem de dar afeto, mas brincava, dizia piadas e ajudava-a sempre que era preciso.

A primeira vez que foram de férias todos juntos foi quando a Vera tinha nove anos de idade. Nessa altura percorreram parte do norte e interior do País.

Momentos únicos nunca esquecidos que a marcaram para sempre.

Apesar de a mãe ser proprietária de um café, nem sempre tudo foi um mar de rosas.

Durante dezoito anos, no inverno, tomava banho dentro de dois alguidares com água aquecida no fogão.

Nem sempre havia tempo para fazer comer, mas nunca passou privações alimentares.

Os melhores brinquedos que teve, como um jogo tétris, foram-lhe oferecidos pelo padrinho, ou por alguns primos que viviam no estrangeiro, assim como pela madrinha que vivia no Luxemburgo.

Comprava roupa nova na altura de começar o ano letivo e no natal ou na páscoa. A avó, tal como era tradição, oferecia a cada neta algumas peças para o enxoval.

Comprou-lhe uma viola de plástico na feira de ano em Seiça cujas cordas demoraram apenas alguns dias a partirem-se.

Não que a viola fosse de má qualidade, mas sim porque a Vera gostava de desmontar tudo o que encontrava.

Não era propriamente uma criança de bonecas, mas sim de carros e berlindes.

Aos dezoito anos alugaram o café a um casal e foram viver para um apartamento que tinham comprado noutra localidade há quatro ou cinco anos atrás.

Levaram consigo a sua avó materna que já tinha vários problemas de saúde.

Foi uma altura de novidade e de adaptação.

Para que servia uma sala?

Tendo wc com água quente podia tomar banho quando quisesse?

Tinha um quarto só para ela?Não foi fácil adaptar-se a tudo isto que era novo e, de certa forma, desconhecido.

Quando terminou o décimo segundo ano decidiu ir para a universidade.

Sempre gostou de psicologia embora a ideia que tinha da psicologia era um pouco diferente da realidade.

Ao ir para uma universidade pública, tendo em conta que a sua média final do secundário era de doze valores, teria de deixar a mãe e a avó sozinhas.

Teria de aventurar-se num mundo desconhecido.

Por isso, tomou a decisão de ir para a universidade do concelho onde pertencia.

A universidade era privada mas com a venda do café entretanto concretizada dava para pagar as propinas e ficar perto de casa.

O curso foi feito com muito esforço, muitas horas de estudo, muitas noites sem dormir.

Declarou-se anti praxe no segundo dia de aulas. Aquelas brincadeiras não lhe diziam muito e não se encaixavam consigo.

Tal como não viveu propriamente a adolescência, naquele momento achava que tinha coisas bem mais importantes para se ocupar. Desde muito nova que aprendeu a viver os problemas da vida real, as dificuldades económicas sempre presentes, as contrariedades impostas por um divórcio dos pais que a fizeram olhar para o mundo de uma forma diferente.

Em setembro de dois mil e seis terminou o curso com uma boa média e uma muito boa prestação no estágio.

Inicia-se a época de enviar currículos e devido à falta de resposta existe a decisão de abrir um consultório privado.

Algo que não aconselha ninguém a fazer porque a experiência profissional ainda era muito escassa para o fazer. Contudo, com este “tiro no escuro” aprendeu que nem sempre o que parece mais fácil é o melhor.

Era um espaço com uma renda baixa e bem localizado mas as obras de conclusão do espaço que teve que fazer, levaram-na a contrair créditos demasiado altos para a altura.

Em dois mil e sete, tendo em conta que o apartamento em que vivia com a mãe (a avó já tinha falecido em dois mil e quatro) era num segundo andar, surgiu a possibilidade de o vender e comprar uma casa.

Num processo não muito simples, assim o fizeram com a ajuda de alguns familiares.

Contudo, este passo teve como consequência a aprendizagem de que podemos ter as melhores intenções e prometermos que nunca vamos falhar, mas a própria vida muitas vezes nos prega partidas e nos coloca em posição de falharmos com muitas coisas e com muitas  pessoas.

A nossa palavra perde importância quando a vida nos coloca obstáculos no caminho.

Em dois mil e onze a sua mãe voltou a ter outro acidente vascular cerebral, desta vez designado por enfarte frontal, para juntar a alguns ait’s que foi tendo ao longo dos anos.

A sua mãe teve de deixar de trabalhar e durante um ano e meio esteve de baixa sem receber nada da segurança social.

Enquanto o seu médico de família lhe dizia para nem pensar em voltar a trabalhar e conduzir, algumas pessoas diziam para ir trabalhar um ou dois dias e depois voltar para a baixa remunerada.

Mas, como é que se deixa uma mãe ir trabalhar uma noite (na altura o trabalho dela era ser cozinheira numa cantina de uma empresa durante a noite) tendo o medo de que lhe acontecesse alguma coisa e a Vera ficasse sozinha?

Em termos económicos teria sido uma melhor opção fazê-lo, mas o medo falou mais alto.

No início de dois mil e catorze, já com a mãe reformada por invalidez parcial, a situação económica era caótica. Crédito para pagar crédito.

Uma bola de neve que infelizmente muitas pessoas sabem como funciona.

Existiu uma altura de revolta.

A Vera nunca se tinha aproximado muito da família, não lhes contava o que ia fazendo e cada vez se foi afastando mais ao longo dos anos. Ia apenas a alguns almoços ou jantares para os quais era convidada, mas não se sentia bem.

Talvez a sua noção de família estivesse distorcida por tudo o que tinha vivido no passado. Talvez nunca tivesse tido a abertura para os deixar entrar dentro da sua vida.

Existe quem lhe chame orgulho, a Vera designa-o como consequência de uma vida que não conseguiu endireitar. Durante algum tempo considerou que a família tinha a obrigação moral de ajudar, mas mais tarde percebeu que não temos o direito de exigir nada dos outros quando as escolhas foram nossas.

A responsabilidade é nossa. E pior, muitas vezes a nossa responsabilidade coloca em risco ou trás consequências negativas a outras pessoas que nunca quisemos magoar nem prejudicar de forma consciente.

Para lidar com tudo o que estava a acontecer precisava de espaço e tempo para pensar.

Por isso no início de outubro do ano passado foi com a mãe passar alguns dias a uma zona próxima da Sertã em Pedrógão Grande.

No dia sete de outubro vieram visitar a Sertã pela primeira vez e, sem sombra de dúvida, existiu uma identificação imediata com o local.

Já há muito tempo que pensavam em mudar de vida.

Vender a casa, pagar as contas e ir viver para outro sítio.

A sua mãe colocava a hipótese de saírem de Portugal, mas a Vera não se imaginava a fazê-lo.

Gosta demais do seu país para o fazer. A casa já se encontrava à venda.

Tardavam a surgir compradores.

O tempo passava e a situação ia piorando.

Por isso, a decisão confirmou-se.

A dezanove de dezembro do ano passado carregaram as coisas mais necessárias e rumaram ao concelho da Sertã.

Deixaram para trás a casa, os eletrodomésticos, as mobílias, as carpetes, os cortinados.

Deixaram para trás a família de quem não se despediram porque o malestar causado pela vergonha da situação em que estavam era demasiado duro para ser suportado naquela altura.

Na Sertã a Vera não tinha trabalho, não tinha amigos, não conhecia nada nem ninguém.

Tudo começou do zero naquele momento.

O clima era diferente.

O corpo não estava habituado.

A casa para onde foram viver não tinha grandes condições.

Mas não podiam desistir. Aliás, desistir é uma palavra que nunca fez parte de si mesma.

Em fevereiro deste ano mudaram de casa e desde então que vivem na Várzea dos Cavaleiros, uma freguesia da Sertã. O primeiro mês foi difícil.

Nos primeiros dias dormiram no chão, depois passaram a dormir em dois sofás-cama, um que pertencia à casa e outro que tinham trazido consigo.

Felizmente conheceram algumas famílias que as ajudaram.

Hoje dormem em duas camas emprestadas e têm um frigorífico que também é emprestado.

Ainda não conseguiram adquirir estes bens mas todos os dias são de luta.

A sua mãe encontra-se completamente integrada onde vivem.

Frequenta a ginástica sénior, encontra-se estável em termos de saúde, partilha muitos momentos do seu dia com vizinhas e amigas, ajudando-as em tarefas que já não fazia desde que era solteira.

Passa pouco tempo sozinha e as pessoas humildes desta zona são as primeiras a convidá-la sempre que existe uma festa ou simplesmente para um almoço ou jantar diferente em casa de alguém.

Consegue ser autónoma dentro das suas limitações e pretende viver por aqui até morrer.

A Vera encontrou algumas pessoas que confiaram em si sem pedir nada em troca.

Não pela sua história de vida, mas principalmente pelas suas capacidades. Ainda existem pessoas boas neste mundo. Neste grupo de pessoas existiu alguém que a ajudou a editar o seu segundo livro intitulado “Recomeçar” em julho deste ano.

Ajudou ainda a estabelecer contatos para que ela conseguisse abrir o seu consultório na Sertã também em julho.

Sem sombra de dúvida, esta pessoa terá por ambas, mãe e filha, uma gratidão eterna.

Em março deste ano algumas pessoas da sua família fizeram centenas de quilómetros para tentar ajudá-la. A casa no concelho da Figueira da Foz ainda não tinha sido vendida e era urgente fazer algo.

A situação financeira continuava péssima.

Muitas vezes quando não estamos a passar por situações simples acabamos por não perceber a intenção de algumas pessoas, e, muito menos, de a valorizar.

Contudo, as exigências feitas para que existisse ajuda por parte da família não faziam sentido a nenhuma das duas e recusaram essa ajuda.

Mas o problema continuava por resolver e tinha de ser encontrada alguma solução urgente.

Durante uma semana a Vera foi pesquisando soluções e em casa passavam-se os dias a ponderar o que fazer.

Não foi uma decisão fácil.

Não foi uma decisão tomada com o intuito de prejudicar ninguém.

Mas a solução encontrada foi partir para a insolvência pessoal.

Desde abril que a Vera se encontra em situação de insolvência pessoal.

Quando lemos testemunhos de pessoas que se encontram nestas situações parece que é o fim do mundo, mas elas já viviam nesse fim do mundo.

A casa no concelho da Figueira da Foz está neste momento em fase final de ser vendida no âmbito do processo de insolvência.

Decidiram fazer tudo para que durante os próximos cinco anos tudo seja pago aos credores.

E, caso não consigam, o que ficar em divida será pago por sua conta e risco, porque a Vera não pretende respeitar a exoneração do passivo restante.

Esta foi uma solução para resolver a sua situação e não para ludibriar os credores.

Qualquer um de nós pode estar um dia na situação de credor e também não gostaríamos de ver que alguém nos ficou a dever um cêntimo.

Aos poucos esta nova vida começa a tomar forma.

Muitos disseram para arranjar um emprego normal em vez de trabalhar como psicóloga, mas a Vera não aceitou.

A sua teimosia ou determinação fazem-na lutar por uma profissão em que acredita.

Os seus pacientes, mesmo aqueles que já o foram há nove anos atrás, continuam a dar-lhe força para seguir em frente como psicóloga.

Alguns dias são mais cinzentos, mas a esperança do nascer do sol leva-a, uma vez mais, a não desistir. As suas prioridades são trabalhar para pagar as contas.

Pretende pagar cada cêntimo, pretende continuar a fazer tudo para dar qualidade de vida à sua mãe.

Nos poucos tempos livres que tem ocupa-os a escrever ou a apreciar a ribeira e as fantásticas paisagens desta terra. Sempre que há uma festa nas aldeias próximas tenta ir com a mãe para que esta se distraia um pouco de uma vida que foi madrasta em muitos momentos.

Por cá já tem alguns amigos.

Pessoas com quem pode contar quando algo corre menos bem.

Nalgumas noites mais sombrias sente algumas saudades do mar ou de pessoas que deixou totalmente para trás.

O seu foco neste momento é o trabalho.

Agradece ao Município da Sertã a forma como foi recebida e acolhida.

Agradece a todas as entidades locais a forma como tem sido acarinhada.

Sempre que lhe perguntam porque vieram para a Sertã respondem que decidiram mudar de vida, mas no fundo, foi mais do que isso.

Procuraram paz, equilíbrio, um local onde se sentissem bem e onde pudessem começar de novo.

Não é  fácil começar de novo aos cinquenta e sete anos, mas a sua mãe sempre participou das suas decisões. Ambas, no fundo, têm-se apenas uma à outra.

A Vera, hoje com trinta e dois anos, não saiu do país à procura de uma vida melhor.

Procurou-a cá dentro.

E tem a certeza de tudo fazer para poder viver este recomeçar de uma forma calma e tranquila.

Por vezes temos de perder tudo para começar de novo.

Por vezes temos de nos afastar de todos para percebermos a sua importância.

Talvez um dia consigam voltar a cruzar-se com as pessoas do seu passado sem sentirem que as defraudaram ou sem sentirem a humilhação com que em vários momentos foram olhadas por nem sempre terem tomado as decisões certas ou por a vida lhes ter colocado tantos obstáculos no caminho.

O objetivo agora é crescer, estabilizar e melhorar a cada dia.

A Vera, como costuma dizer, não é melhor nem pior do que ninguém.

É ela mesma, indo ao encontro do seu interior e do que a faz sentir bem.

De uma coisa tem a certeza: a sua vida não será inglória nem em vão!

Escrito em Novembro de 2015

Nota do Director

Fiéis aos nossos propósitos desde sempre (lutar pelo interior, levar o interior ao mundo ), congratulamo-nos com o apoio da Dra. Vera Silva Santos. Seja bem vinda.

Pode contar também com o apoio da Dra Vera na Sertã, veja a página profissional

 http://verasilvasantos.webnode.pt/

Livro Um motivo para viver

Livro Um motivo para viver

Livro Recomeçar

Livro Recomeçar

Share