
Memórias de Portugal
Mapa cor de rosa
Quando em 1890 Serpa Pinto fez uma incursão à frente de um grupo de militares, arreando a bandeira Inglesa junto ao lago Niassa, Paiva Couceiro também entrava em Barotze vindo do Bié – Angola, que numa manobra concertada com Serpa Pinto entravam em território que os Ingleses consideravam seu ou no mínimo neutro.
Ambos estavam longe de imaginar, o terramoto político e financeiro que tinham acabado de causar em Portugal; dando lugar ao ultimato em jeito de memorando, que levou o país à banca rôta 2 anos mais tarde, e ao regicídio 18 anos depois; que ditaria o fim da monarquia em 1910.
Com o Brasil fora do Império há 6 décadas, Portugal iria tentar estabelecer uma ligação terrestre do Atlântico ao Indico, colidindo com a ambição Inglesa de ligar uma linha ferroviária do Cairo á cidade do Cabo.
O pretexto que Serpa Pinto deu aos Ingleses foi para eles a cereja no topo do bolo; uns anos antes por motivo idêntico, a França e Inglaterra estiveram à beira de um conflito.
Quem olhar para o mapa político de África até aos anos 60, sabe que os Ingleses deixaram sempre o seu nome bem patenteado por onde passaram, mantendo ainda uma grande influência naquele Continente através da Commonwealth.
Paiva Couceiro
Os portugueses saíram de África 500 anos depois sem glória nem dignidade; arrastando connosco mais de 1.2 milhões de deslocados e retornados; muitos deles nunca tinham antes pisado o solo português; sendo Portugal protagonista da maior e vergonhosa fuga aérea de África para a Europa, onde não foram salvaguardadas minimamente o interesse daqueles, que dedicaram as suas vidas a dignificar o nome de Portugal.
As reais consequências deste drama, que não serviu nem salvaguardou os interesses das partes, ainda estão por sarar e contabilizar; Portugal nunca mais recuperou deste trauma.
Existe uma realidade que não podemos esconder; todos os países excluindo a África do Sul e a Rodésia, queriam ver Portugal fora de África.
Serpa Pinto
Voltamos ao ultimato Inglês que foi entregue a 11 de janeiro de 1890 a mando de Lord Salisbury ao tempo o Primeiro ministro Britânico; note-se que Portugal já tinha reclamado em 1885 na conferência de Berlim, esta ligação de contracosta de Angola a Moçambique, e tinha o apoio da Alemanha mas os Ingleses tinham outras ideias.
Se não fosse a atual situação que vivemos no nosso país, de certeza que tentaria apagar da minha memória, o triste ciclo vivido pelos portugueses nos finais do século XIX e princípios do XX que levou ao fim da monarquia; a que se seguiram 18 anos de revoluções que devastaram Portugal.
Por ironia, o ato irrefletido de Serpa Pinto e Paiva Couceiro que na época foram considerados heróis, sendo inclusivamente Serpa Pinto nomeado para o mais alto posto-militar o de ajudante de campo do Rei, revela que nem tudo ia bem com Portugal naquela conturbada época, onde se jogava o destino dos povos de África,, que e os portugueses assumiam o papel do elo mais fraco da tabuleiro do xadrez, que ditava a nossa fuga de África 85 anos mais tarde sem honra nem glória, protagonizada por uma grande dose de desnorte, e muita covardia e submissão política
A subserviência aos Ingleses política e financeira foi total, e com várias e terríveis consequências; onde incluía a participação portuguesa na primeira guerra mundial; o desastre português foi tal, que só na batalha de La Lys a 9 de abril de 1918, deixamos para trás milhares de mortos; Portugal nunca mais recuperou do vexame imposto pelos ingleses com o ultimato de 1890.
Os franceses honraram os nossos heróis com o monumento no cemitério de Richebourg, e aos Ingleses pagámos a última “tranche” da dívida que foi feita em 1892 e renegociada em 1902 no dia 30 de março de 2011 a data em que foi por fim liquidada.
Foram 125 anos “5 gerações” a do meu bisavô que contraiu a dívida, porque nasceu no ano dela em Aljubarrota – Alcobaça; tendo sido obrigado a emigrar em 1919 para Fall River Massachusetts Estados Unidos onde nasceu o meu pai; tudo um dano colateral da incursão em território neutro por Serpa Pinto e Paiva Couceiro.
Com o final do primeiro conflito Mundial as fábricas começaram a fechar; seguiram-se anos da penúria, com a recessão á porta e o desemprego a subir em flexa; a pouca oferta de trabalho que apenas dava para comprar pão e pouco mais, ditaram a sua sorte da minha família paterna; meu avô faleceu dois anos depois de chegar aos Estados Unidos com 31 anos de idade, tinha o meu pai 6 meses de idade.
A minha avó regressou a Portugal em 1932 a um ano da “crise” ter atingido o pico; o filho (meu pai) acabava de fazer 12 anos nunca mais regressou à América; entretanto a recessão já tinha atravessado o Atlântico, onde a Alemanha seria o país mais atingido.
O que aconteceu depois foram 75 milhões de mortos no segundo conflito Mundial, e o que vem a seguir não se sabe; parece que o passado não nos serviu de lição.
Por ironia e no nosso caso, os responsáveis do passado e do presente terão sempre a garantia dos seus nomes ostentados em placas toponímicas nas nossas vilas e Cidades.
Tanto nos dias de hoje como no passado a “fuga” dos portugueses continua, em busca de uma vida mais digna.
A única diferença, é que os aviões já não chegam de África; partem em todas as direções do Globo terrestre, com lotações esgotadas pelos nossos novos emigrantes em busca de trabalho digno; para trás, deixam as suas famílias e as Vilas e aldeias onde nasceram.
OBS: Ao meu avô paterno nascido em Aljubarrota no ano do ultimato inglês de 1891, às comunidades Lusitanas espalhadas pelo Mundo, e a todas as crianças e jovens do nosso país, que insistem em nascer num país hipotecado a todos os níveis; e que aos poucos, está a deixar de pertencer aos portugueses.
A lição só a aprende, quem não volta a repetir o mesmo erro.
J. Vitorino – Jornalista – Diretor
